Antropologia

 

Antropologia

 

OS ELEMENTOS ESSENCIAIS DA NATUREZA HUMANA

Há duas teorias com referência aos elementos essenciais da natureza humana. Notamo-las na seguinte ordem:

I. A TEORIA TRICOTÔMICA

As duas passagens seguintes são tidas por alguns para ensinar uma divisão tríplice da natureza humana em corpo, alma e espírito, estas constituindo três elementos distintos em a natureza do homem:

“E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito e alma e corpo sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Tessalonicenses 5:23).

“A Palavra de Deus é viva e eficaz, mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, que penetra até à divisão da alma e do espírito e das juntas e medulas, que é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração” (Hebreus 4:12).

Rejeitemos esta teoria pelas seguintes razões:

1. SE A ENUMERAÇÃO TRÍPLICE EM 1 TESSALONICENSES 5:23 DEVE SER TOMADA COMO SIGNIFICANDO TRÊS ELEMENTOS DISTINTOS NO HOMEM, ENTÃO MATEUS 22:37 DEVE SER TOMADO COMO NOMEANDO, NOMÍNIMO, UM ELEMENTO ADICIONAL, FAZENDO-OS QUATRO AO TODO.

Mateus 22:37 reza: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu pensamento.” Precisa ser notado que essa passagem, à luz da interpretação de 1 Tessalonicenses 5:23 pelos advogados da teoria tricotômica, faz de coração e mente elementos diferentes em a natureza do homem. Diga-se agora que a “mente” nesta passagem é idêntica a “espírito” em 1 Tessalonicenses 5:23; mas o “coração” não pode ser identificado com coisa alguma em 1 Tessalonicenses 5:23, desde que “alma”, bem como coração, está mencionada em Mateus 22:37. Assim, para os advogados da teoria tricotômica à luz de sua interpretação de 1 Tessalonicenses 5:23, não há escapar da necessidade de sustentar uma divisão quádrupla da natureza humana.

2. TÃO CERTO COMO ESTÁ MANIFESTO PELA ESCRITURA QUE “CORAÇÃO” E “MENTE” NÃO DESIGNAM ELEMENTOS SEPARADOS DA NATUREZA HUMANA, ASSIM TAMBÉM ESTÁ MANIFESTO QUE “ALMA” E “ESPIRITO” NÃO DESIGNAM.

Presumimos que todos concordarão em que “coração” e “mente” representam não dois elementos distintos da natureza humana, mas apenas duas faculdades; sendo a mente especialmente a faculdade do conhecimento e o coração a faculdade do sentimento. Mais tarde mostraremos que é justamente tão manifesto que alma e espírito não são distintos.

3. HEBREUS 4:12 NÃO DEVE SER TOMADO COMO SE REFERINDO A UMA DIVISÃO ENTRE A ALMA E O ESPÍRITO COMO SE FOSSEM ELEMENTOS SEPARADOS.

Antes pensamos que se refere a “penetração” da alma e do espírito até mesmo às suas juntas e medula, a saber, às mesmas profundezas da natureza espiritual”(A. H. Strong).

4. OS TERMOS “ESPÍRITO” E “ALMA” SÃO USADOS UM PELO OUTRO NA ESCRITURA.

Vide Gênesis 41:8 comparado com Salmos 42:6; João 12:27 comparado com João 13:21 e Hebreus 12:23 comparado com Apocalipse 6:9. Este uso intermudável de ambos os termos é fatal à doutrina tricotômica.

5. DOIS ELEMENTOS APENAS DA NATUREZA HUMANA ESTÃO MENCIONADOS NA CRIAÇÃO DO HOMEM.

Primeiro, Deus criou o corpo do homem. Então Ele assoprou nas ventas desse corpo o fôlego (espírito) de vida e assim o homem se tornou alma vivente. Cf. Gênesis 2:7. O homem não veio a ser primeiro alma vivente ou a possuir uma alma e então receber o espírito em adição: foi a recepção do espírito que o fez alma vivente.

6. JESUS DIVIDIU A NATUREZA HUMANA SÓ EM DOIS ELEMENTOS.

Em Mateus 10:28 disse Jesus: “Não temais os que matam o corpo, mas não podem matar a alma; antes temei o que pode destruir tanto a alma e o corpo no inferno”. Se há três elementos em a natureza humana, que sucede ao terceiro quando corpo e alma vão para o inferno? Se Eclesiastes 12:7 se oferece em resposta a esta pergunta, respondemos a palavra hebraica traduzida “espírito” nesta passagem, não pode ser tomada como significando “espírito” no sentido em que a usamos aqui: significa meramente “fôlego”. Em resposta, pode ser dito que, se a palavra hebraica aqui significa apenas fôlego, então ela significa o mesmo em Gênesis 2:7, onde a temos interpretado como significando espírito. Mas desde que, após a partida do fôlego, o homem continua a ser uma alma vivente, como evidenciado por seu sofrimento cônscio eterno, no caso de ele ir para o inferno (Gehenna), deve ser entendido que a palavra em Gênesis 2:7 significa mais do que fôlego.

Não fique entendido que o que estamos dizendo aqui é que não há nunca qualquer distinção que seja entre alma e espírito. Enquanto elas são muito freqüentemente usadas como sinônimos, contudo, algumas vezes, traça-se uma vaga distinção; mas esta distinção não é entre elementos diferentes da natureza humana. Quando se faz uma distinção, ambos os termos meramente “designam o princípio imaterial de diferentes pontos de vista” (A. H. Strong). “Concluímos que a parte imaterial do homem, vista como uma vida individual e cônscia, capaz de possuir e animar um organismo físico, chama-se “psuke” (alma); vista como um agente moral e racional, suscetível de influência e habitação, esta mesma parte imaterial chama-se “pneuma” (espírito). O “pneuma” (espírito), pois, é a natureza do homem olhando para Deus e capaz de receber e manifestar o “Pneuma Hagion” (Espírito Santo); a “psuke” (alma) é a natureza do homem olhando para a terra e tocando o mundo dos sentidos. O “pneuma” (espírito) é a parte mais elevada do homem como relacionada às realidades espirituais ou como capaz de tal relação; a “psuke” (alma) é a parte mais elevada do homem como relacionada com o corpo ou como capaz de tal relação. O ser do homem, portanto, não é tricotômico senão dicotômico e a sua parte imaterial, enquanto na posse de dualidade de faculdades, tem unidade de substância. A natureza do homem não é uma casa de três andares senão de dois, com janelas no andar de cima dando para duas direções: para a terra e para o céu. O “andar térreo” é a nossa parte física: o corpo. Mas o “andar superior” do homem tem dois aspectos: há uma visão para as coisas embaixo e uma clarabóia através da qual se vêem estrelas” (Strong, Systematic Theology, pág. 246). “A alma é espírito modificada pela união com o corpo” (Hovey).

II. A TEORIA DICATÔMICA

Em vista de todas as considerações precedentes, somos pela teoria dicatômica da natureza humana antes que pela tricotômica: a primeira encara o homem como se compondo de duas partes, uma material (corpo) e outra imaterial (alma ou espírito).

Já justificamos a primeira, ao menos para nossa própria satisfação, contra a segunda. Só nos resta agora responder aos que recusam até mesmo uma dupla divisão da natureza humana e negam que a alma seja um elemento atual, distinto do corpo. Como prova que o corpo e alma são dois elementos distintos, oferecemos os seguintes argumentos:

1. DISSE JESUS QUE O HOMEM NÃO PODE MATAR A ALMA.

Vide Mateus 10:28. E, na mesma passagem Ele também disse que o homem pode matar o corpo; logo, corpo e alma são elementos distintos.

2. O HOMEM CONTINUA A EXISTIR DEPOIS DE O CORPO VOLTAR AO PÓ.

Para prova disto vide o capítulo sobre “O Estado Presente dos Mortos”.

3. A MORTE FÍSICA É TRATADA COMO A PARTIDA DA ALMA DO CORPO E A VINDA À VIDA OUTRA VEZ É TRATADA COMO A VINDA DA ALMA OUTRA VEZ AO CORPO.

Vide Gênesis 35:18; 1 Reis 17:22. Algumas vezes a palavra hebraica “alma” nestas passagens (nephesh) significa meramente vida; mas um tal sentido da bem em 1 Reis 17:22, porque aí se afirma que “a alma da criança lhe voltou e ela reviveu” ou viveu outra vez. Traduzir “nephesh” aqui por “vida” faria as palavras rezarem: “A vida da criança veio-lhe outra vez e ela viveu outra vez”.

4. PAULO CHAMA O CORPO MERAMENTE NOSSA CASA TERRESTRE E DIZ QUE TEREMOS UMA OUTRA CASA APÓS A DISSOLUÇÃO DO CORPO.

Vide 2 Coríntios 5:1-4. Esta outra casa é o corpo espiritual que os crentes receberão na ressurreição. Assim o homem interior ou a alma pode mudar-se desta casa para outra e é, portanto, tão distinta em substância e separável em natureza como o corpo humano o é da casa em que mora. O corpo físico é somente a moradia terrena da alma.

A NATUREZA MORAL DO HOMEM

O homem é uma criatura moral. Com isto queremos dizer que ele é responsável pelas suas ações. Isto é um dos sinais por que o homem se distingue da besta. O homem se constitui criatura moral por aquelas faculdades que o fazem responsável pelas suas ações. Essas faculdades são três:

I. INTELECTO

Intelecto é a faculdade da percepção ou pensamento. É o poder de o homem saber ou receber conhecimento. Sem isto o homem não seria uma criatura moral. Isto está ensinado por Jesus em João 9:41.

II. CONSCIÊNCIA

De um ponto de vista estritamente psicológico a consciência não é considerada como uma faculdade separada. Deste ponto de vista as três faculdades são intelecto, sensibilidade e vontade; sendo a consciência considerada como a ação combinada dessas três faculdades dando ao homem um senso íntimo de sua responsabilidade moral e julgando entre o bem e o mal. Todavia, a consciência pode, num sentido, ser considerado como uma faculdade, porque é poder da mente conhecer o bem e o mal e sentir-se obrigado a fazer o bem. Assim o juízo está envolvido na consciência. E a razão está envolvida no juízo.

Em suma, a consciência é o guia final do homem. Errôneo é fazer uma distinção entre seguir a própria consciência e seguir a Lei de Deus. A Lei de Deus não tem meio de nos alcançar exceto através da consciência. Quando fazemos o bem, só o pode ser como resultado de incitação da consciência, que obra segundo o padrão aceitado pela mente. Assim a consciência nos guia direito só em proporção à justeza do padrão que tivermos aceitado como nosso guia. Daí a necessidade de conhecimento correto da Palavra de Deus.

III. VONTADE

A vontade do homem está definida por A. H. Strong como “o poder da alma de escolher entre motivos e dirigir sua atividade subseqüente de acordo com o motivo assim escolhido, em outras palavras, o poder da alma de escolher tanto o fim como os meios de atingir o escolhido”. Diz o mesmo autor: “A escolha de um fim último chamamos preferência imanente; a escolha dos meios chamamos volição executiva”.

Como observamos em considerarmos a vontade de Deus, a vontade não é independente da natureza do seu possuidor. Não é, como fosse, um outro eu dentro de nós. O caráter da vontade é o caráter do indivíduo que a possui. A vontade é, simplesmente, um poder da alma.

Os atos da vontade são determinados por dois fatores: motivos e caráter. Usamos o termo “motivos” significando razões e induzimentos influenciando na direção de certos atos da vontade. Destes dois fatores, o caráter é o mais dominante, porque em todo ato da vontade fazemos escolha entre dois ou mais motivos e é o nosso caráter que determina que motivo escolhemos.

Todo ato da vontade é uma expressão de caráter em vista de motivos e todo ato da vontade tende a modificar ou confirmar o caráter. Isto explica porque uma dada escolha da vontade se torna mais fácil cada vez em que ela se faz.
 

O ESTADO ORIGINAL E A QUEDA DO HOMEM ( Pecado )

Em Eclesiastes 7:29 lemos: “Eis-que, só isto achei: que Deus fez o homem direito, mas eles buscaram muitas invenções”. Nada é mais evidente do que os dois fatos mencionados nesta passagem; a saber, a justiça original do homem e a sua queda mais tarde.

I. O ESTADO ORIGINAL DO HOMEM

1. O FATO EM SI.

A passagem a pouco citada nos diz que Deus fez o homem justo. É isto evidente da natureza de Deus: sendo infinitamente santo. Ele só podia criar aquilo que é justo. Então se nos diz em Gênesis 1:31 que Deus viu que tudo quanto Ele fez foi muito bom. Isto inclui o homem. Mais ainda, se nos diz que Deus fez o homem na Sua própria imagem (Gênesis 1:27).

2. A IMAGEM DE DEUS NO HOMEM.

(1) Considerada Negativamente.

A imagem de Deus no homem não consistiu de uma trindade análoga à trindade divina. Já discutimos isto circunstanciadamente no capítulo sobre “Os Elementos da Natureza Humana”. Nesse capítulo mostramos que o homem consiste não de três partes senão de duas; e, se ele consistisse de três partes, que membro da trindade representaria o corpo do homem?

(2) Considerada Positivamente.

A imagem de Deus no homem consistiu de duas coisas, a saber:

A. Santidade.

Nisto teve o homem uma semelhança moral com Deus. Ao afirmarmos que santidade foi uma parte da imagem de Deus no homem, queremos dizer que, na criação do homem, Deus comunicou as faculdades humanas uma inclinação reta. A santidade deve ter sido parte da imagem de Deus no homem porque santidade é o atributo fundamental de Deus. Que santidade foi uma parte da imagem original de Deus no homem está também confirmado pelo fato que ela se comunica na renovação da imagem de Deus na regeneração (Efésios 4:24; Colossenses 3:10). Isto está confirmado mais além por Eclesiastes 7:29.

A semelhança moral original do homem com Deus constitui em mais que mera inocência. Foi santidade positiva. Só isto pode satisfazer a afirmação que o homem foi feito à imagem de Deus. Se inocência fosse bastante para satisfazer essa afirmação, então seriamos obrigados a concluir que cada criancinha nasce na imagem moral de Deus, o que a Escritura nega (Salmos 51:5; 58:3; Jeremias 17:9).

B. Personalidade.

Nisto o homem tem uma semelhança natural com Deus. A personalidade pode ser definida como auto-concienciosidade e autodeterminação. A primeira é a habilidade do homem em conhecer-se distintamente de tudo o mais e de analizar-se. A segunda é o poder de fazer escolhas em vista de motivos. Tais escolhas envolvem a razão e o juízo; e, quando se relacionam com assuntos morais, envolvem consciência.

É a personalidade que distingue o homem num modo natural do bruto. O bruto tem senso íntimo, mas não auto-concienciosidade. Nenhum bruto jamais pensou “Eu”. Nenhum bruto jamais se deteve para analizar-se. Um bruto nunca reflete sobre sua própria natureza em distinção de tudo mais. Ele nunca se empenha em introspecção. Nem o bruto faz escolhas em vista de motivos. Suas ações são determinadas por instintos e por influencias de fora. Assim, o bruto tem determinação, mas não autodeterminação. Que o bruto se move por instinto mais do que por escolha em vista de motivos está evidenciado pelo fato que os brutos nunca melhoram nos seus métodos de fazer as coisas.

Que a personalidade foi uma parte da imagem de Deus no homem está evidenciado pelo fato que o homem decaído, falto de santidade, ainda se diz estar na imagem de Deus. Vide Gênesis 9:6; I Coríntios 11:7; Tiago 3:9.

II. A QUEDA DO HOMEM

A santidade original do homem não era imutável. A mutabilidade é uma característica necessária da natureza humana. Imutabilidade requer infinidade de conhecimento e poder. A infinidade é uma característica só da divindade. Portanto, desde que Deus desejou criar o homem e não um deus, Ele fez Adão mutável. Isto tornou possível a queda. Notemos, então, em referência à queda:

1. O FATO EM SI.

Em Gênesis 3 temos a narrativa da queda. De modo que a queda é um fato revelado. Também é um fato que é evidente, como já o indicamos.

2. O PROBLEMA EM SI.

Quando vimos estudar a queda do homem, somos abordados pelo problema de como um tal ser, como Adão foi, pode cair. Notemos a respeito deste problema:

(1) Uma explicação errônea.

Algumas vezes uma explicação do problema da queda do homem é tentada por representar-se o seu estado original como um de mero equilíbrio no qual foi tão fácil escolher o erro como foi escolher o direito. Em outras palavras, a vontade estava tal estado de indiferença e tão suscetível de agir de um modo como de outro. Uma noção tam como esta reduz o estado original do homem a uma condição de mera inocência em vez de santidade positiva. Já tocamos nisto e confiamos em que mostramos que, mera inocência, não satisfaz a afirmação que o homem foi criado na imagem de Deus.

(2) A explicação direita.

Não devemos ver a dificuldade insuperável aqui reconhecida por muitos. Pensamos que a dificuldade encontra uma explicação satisfatória nos seguintes fatos:

A. Adão era mudável.

Já discutimos este fato.

B. Sendo mudável, só podia permanecer firme no seu estado original pelo poder de Deus.

Vide o capítulo sobre “A Relação de Deus com o Universo”. Nada fica na sua própria força inalterado exceto aquilo que é imutável.

C. Deus podia justa e santamente permitir a Adão cair se Lhe agradasse.

Desde que Deus permitiu o pecado, ninguém objeta à permissão da queda, salvo aqueles que queiram criticar Deus.

D. Deus, tendo escolhido permitir a queda, retirou de Adão o Seu poder sustentador e a natureza de Adão degenerou tanto como o universo inteiro cairia aos pedaços se Deus retirasse o Seu poder sustentador e conservador por um só instante.

3. OS RESULTADOS EM SI.

(1) O primado de Adão.

Quando Adão provou a corrupção de sua natureza, ele não ficou como simples individuo senão como o cabeça natural da raça. O primado natural de Adão está claramente ensinado no capítulo quinto de Romanos. O seu primado ali não se apresenta como simples primado federal. Adão não pecou meramente por nós, como se ele fosse o mero cabeça federal da raça; nós pecamos nele (Romanos 5:12).

(2) Os efeitos da queda.

A. Sobre Adão e Eva.

Adão e Eva sofreram a corrupção de sua natureza, a qual lhes trouxe ao mesmo tempo morte natural e espiritual.

B. Sobre a Raça.

O efeito total da queda de Adão sobre a raça é a corrupção da natureza da raça, a qual traz a raça a um estado de morte espiritual e a torna sujeita à morte física.

Os descendentes de Adão são feitos responsáveis, não pelo ato manifesto de Adão em participar do fruto proibido senão pela apostasia interior de sua natureza de Deus. Não somos pessoalmente responsáveis pelo ato manifesto de Adão porque o seu ato manifesto foi o ato de sua própria vontade individual. Mas, nossa natureza, sendo uma com a dele, corrompeu-se na apostasia de sua natureza dele. Daí, o efeito da queda sobre a raça não consiste tanto da culpa pessoal pelo ato manifesto de Adão como da corrupção da natureza da raça. Não somos responsáveis por qualquer coisa de que não podemos arrepender- nos quando vivificados pelo Espírito de Deus. Está qualquer homem hoje convicto do pecado de Adão de participar do fruto proibido? Mas nós nos sentimos convictos e podemos e nos arrependemos da corrupção de nossas naturezas, corrupção que se manifesta em rebelião contra Deus e em transgressões pessoais. Não cremos que a Escritura ensine mais do que isto a respeito dos efeitos da queda sobre o raça. Para uma discussão de João 1:29 a este respeito, vide o capítulo sobre a expiação.  

4. A DIFERENÇA ENTRE ADÃO E EVA NA QUEDA.

A narrativa do Gênesis não faz diferença vital entre Adão e Eva na queda, mas uma distinção está claramente apresentada em 1 Timóteo 2:14, onde se diz que Eva foi enganada e Adão não. Isto quer dizer que Eva caiu em transgressão porque ela foi levada a pensar que o aviso de Deus não era verdade e que ela não morreria como uma penalidade por participar do fruto proibido. Mas com Adão foi diferente: ele não duvidou da Palavra de Deus; ele pecou porque preferiu ser expulso do Éden com sua esposa antes que ficar no Éden sem sua esposa.

Muita vez se pensa que os fatos acima ligam maior culpa ao pecado da mulher do que ao pecado de Adão, ao passo que o reverso é que é verdade. O homem pecou por meio da escolha voluntária e cônscia da amizade de sua esposa, antes que a de Deus. Nada disto foi verdade do pecado de Eva.

5. POR QUE DEUS PERMITIU A QUEDA?

Não foi porque Deus foi compelido a permiti-la. Deus é soberano e faz tudo livremente. Não foi porque Lhe faltasse o poder. Conquanto Deus fez o homem mudável, o que foi necessário, como temos mostrado, contudo Ele podia ter conservado o homem do pecado sem a violação da vontade ou de qualquer princípio. Podemos dar apenas uma resposta à pergunta acima. É que Deus permitiu a queda para prover o meio para a glorificação do Seu Filho na redenção.

6. A QUEDA E A SANTIDADE DE DEUS.

Talvez a razão carnal jamais fique satisfeita com qualquer explicação da queda em relação com a santidade de Deus. Como podia um Deus santo permitir o pecado quando Ele teve todo o poder de impedir? De que Ele teve esse poder não pode ser duvidado. E ao passo que a razão carnal não se satisfaça nunca, contudo a fé na Palavra de Deus satisfaz a nova mente em que a permissão do pecado por Deus está perfeitamente consiste com a Sua santidade. Teve-se o poder de impedir o pecado e não o fizemos, seriamos culpados do mal, mas Deus é diferente de nós: somos dependentes e, portanto, responsáveis. Deus é independente e, portanto, responsável a ninguém. Quando nós conhecermos como somos conhecidos, então poderemos entender completamente como a permissão para pecar é perfeitamente compatível com a perfeita santidade de Deus.
 

Apostila Setes
Teologia Sistemática

 

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